Marido viajando por três semanas. Casa super silenciosa com uma filha na escola e a outra no Brasil, mãe entretida em seus quebra-cabeças. Almoço estrategicamente pronto, desde ontem. Um ar de satisfação ronda o ambiente. É verdade que não está necessariamente nos planos sair por aí a procura de uma balada; a casa nunca me pareceu palco pra tantas aventuras. A vontade de transgredir passa pela ousadia de gostar de estar sozinha e poder tomar decisões sem ter que esperar pelos outros.
Comecei meus 21 dias de solidão atirando tintas sobre uma tela enorme que comprei por uma pechincha. Já tinha feito inúmeras tentativas de terminar a obra, mas não estava satisfeita. Foi quando pretensiosamente me lembrei de Picasso e da idéia de que um quadro nunca está terminado, nós é que desistimos dele. Pois bem, desisti feliz da vida e corri pra pendurar o mesmo na sala de jantar, a fim de garantir mais luz e cor ao ambiente.
Dei dois passos para trás e gostei do que vi, mesmo certa de que o marido vai reclamar por eu não ter esperado por ele para fazer o furo na parede da maneira correta, talvez antes mesmo de elogiar a pintura... mas é o preço que se paga quando se tem desejo de felicidade imediata. Maridos nunca cumprem as tarefas domésticas no tempo regulamentar. Rápido como quem rouba, o fiz, e , melhor, fiquei igualmente orgulhosa de mim mesma, pela pintura e pelo furo. Este último, quase perfeito.