Dizem que no fundo de todo poço existe uma molinha e que esta, quando atingida, nos impulsiona de volta à superfície, livres e lépidos. Mesmo estando ainda em plena queda livre, aqui me encontro, disposta a falar mais de molas do que de poços; o problema é que chegar ao fundo destes leva um certo tempo e aguardo impaciente o momento do impacto, quando fatalmente serei impulsionada rumo ao caminho inverso àquele que me levou escuridão abaixo.
Você pode chamar a molinha como quiser, ela atende pelo nome de providência divina, acaso, segredo, anjo da guarda, pensamento positivo, fé, merecimento, destino...e outros tantos apelidos, todos justificadamente carinhosos. É que quem experimenta a queda, durante seu aparente interminável trajeto, aprende a manter contato profundo com um mundo invisível, onde habitam personagens muitas vezes desconhecidos, a começar por você mesmo.
Antes da tal molinha aparecer, a gente passa a conviver com sensações nem sempre bem-vindas: o choro vem fácil, o mundo vai acabar, todos parecem mais irritantes do que nunca, mais lentos, mais ingratos, comumente ineficientes...os talentos pessoais desaparecem , óbvios que sejam; nada parece excitante, saboroso ou convidativo. Dormir é sempre visto como uma boa saída; mas quem falou que o sono vem fácil para todos aqueles que caíram no tal poço?
Porém, um belo dia, sem qualquer aviso prévio, pelo menos não daqueles que vêm por escrito, a gente dorme miserável e acorda bem cedo com uma esperança surpreendente; é que quando se chega num certo ponto do poço, atinge-se a superfície da molinha e esta finalmente move-se para baixo com força diretamente proporcional ao peso do corpo e da alma ( sim, nesta época tudo isso fica ainda mais pesado) é então que algo nos diz que a queda está perto do fim.
Estar perto do fim não é o fim. Depois de meses caindo, ninguém está necessariamente preparado para vir à tona. Sim, porque quando a mola passa a atuar, sequer dá tempo de passar um batonzinho básico. É a hora do vamos que vamos ou se agarra na mola e fica ai pra sempre, meu bem. Melhor sair de cara lavada mesmo que ficar condenado a esperar resgate pelo resto da vida.
É sabido, contudo, que há quem prefira ali se instalar, travestidos de vítimas do mundo, chegam a ignorar as operações de salvamento. Outros desenvolvem hiper sensibilidade à luz e, quando na superfície, se lançam, aliviados, de volta à escuridão já conhecida.
Depois de um certo tempo caindo, é comum se começar a duvidar da existência das molas propulsoras. Mas, quando isso acontece, é só um sinal de que elas estão bem próximas e não tarda a hora em que virão em seu socorro. Diretamente do fundo do poço, provavelmente a poucos minutos de ser lançada para fora desse tubo escuro e frio, aceno com um sinal de esperança:
Yo no creo en molas propulsoras, pero que las hay, las hay
4 comentários:
Amiga,
amei seu novo post. Talvez por achar que ir ao fundo do poço é parte da vida de todos nós, mas sair de lá é tarefa um tanto quanto herculea, as vezes procuramos a mola e ela parece não se dignar si a mostrar para nós.Mas ai um bela dia, como nos contos de fada, algo acontece.. E creia ela nos empurra de volta, porém o melhor o caminho de volta também é arduo e pelo caminho continuamos aprendendo. Aprendendo inclusive a dar valor ao que de fato importa como pessoas como vc que nos são caras.
Márcia
Lá diz o velho ditado: A Esperança é a ultima a morrer!!!
muito bom o texto, (tia) Adriana. Nunca tinha pensado nesta tal mola, mas realmente, ela parece existir! Eu mesma já fui lançada de volta à superfície da terra várias vezes, e o que veio depois foi muito melhor....Se é mesmo verdade que estás no meio da queda, prepara logo o batom, pq é sempre bom estar preparada....:) um bjão, Marilia
Hmmm, posso dizer que é um dos textos mais inspiradores que li nos últimos tempos.
Inpressindível.
Renato Gurgel
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